28 de fevereiro de 2007

 

Inquérito sobre a governação

Recebi uma mensagem do SNESup:
"INQUÉRITO POR QUESTIONÁRIO SOBRE POSSÍVEIS ALTERAÇÕES AO MODELO DE GESTÃO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR

Colegas:

Vem já de há algum tempo a discussão sobre possíveis alterações ao modelo de gestão das instituições de ensino superior público, com indicação de alternativas quanto à forma de designação e à base de recrutamento dos seus responsáveis máximos, bem como quanto à estrutura orgânica interna e ao relacionamento entre órgãos.

Estando anunciada, para o primeiro semestre do corrente ano de 2007, a apresentação de propostas de medidas legislativas e parecendo-nos imprescindível colher a vossa sensibilidade sobre alguns aspectos fulcrais de possíveis "reformas", vimos solicitar-vos que preencham o questionário disponível no endereço www.snesup.eu.

As respostas ao questionário serão objecto de tratamento por profissionais qualificados. Os resultados do apuramento serão publicados sem que os respondentes sejam identificados."
Achei a ideia muito interessante e fui logo ao inquérito, mas fiquei desiludido, o que motivou a minha resposta ao SNESup.
"Louvo a vossa ideia de um inquérito sobre o sistema de governação das instituições de educação superior. No entanto, a meu ver, é difícil responder ao vosso inquérito porque enferma do mesmo erro básico que a anunciada proposta do governo: a identificação biunívoca "senado/conselho geral". São duas coisas paralelas mas bem distintas, um órgão de governação estratégica (chamemos-lhe conselho geral) e um órgão de governação académica e de participação da comunidade (chamemos-lhe senado). Não posso responder às vossas perguntas que se dirijam simultaneamente a um e a outro órgão. Questão de alhos e bugalhos.

Já escrevi sobre isto, aqui e aqui.
P. S., 14:45 - Impõe-se uma correcção. Segundo informação que acabei de receber do SNESup, o termo conselho geral usado no inquérito não se refere a um possível "board" mas apenas ao já existente conselho dos institutos politécnicos. No entanto, mantenho este apontamento como alerta em relação ao problema que referi, como já tinha referido anteriormente.

 
26 de fevereiro de 2007

 

Modelos

Troca de mensagens com um amigo, Jorge Matos, professor do ensino superior. Escreveu-me:
Uma pergunta ingénua... ou, se calhar, provocatória. Antes do mais, é uma pergunta pessoal sem consequências.

De que modelo universitário saiu a revolução científica do século XX? Ou, se preferirmos, poderia fazer a pergunta assim: de que modelo universitário saíram as mais profícuas produções do pensamento do século XX?

E faço a pergunta (com um ar tão ingénuo quanto me é possível) porque me está a parecer que a resposta não está em Harvard nem em Oxford. Ou estou enganado?
Respondi:
Questão importante. A meu ver, do modelo humboldtiano e, particularmente, das universidades alemãs. O grande sucesso americano está na capacidade de resistência e de assimilação da massificação do pós-guerra, por fazer conviver bem uma grande diversidade institucional, que garantiu instituições de qualidade.

Claro que Oxford e Cambridge também desempenharam um grande papel logo desde o fim do séc XIX, mas isto não nega o que disse, porque, primeiro, o seu modelo newmaniano está bem próximo, no essencial, do modelo humboldtiano. Segundo, porque também tem alguma características bem distintivas em relação ao americano.

O que é que acha desta minha opinião?
Réplica de Jorge Matos:
A sua resposta corresponde exactamente aquilo que eu pensava.

Fiz-lhe a pergunta na sequência de uma conversa com um amigo meu que chegou agora dos Estados Unidos, onde esteve a fazer um conjunto de conferências. Ainda lá, enviou-me um mail onde falava das excelentes condições de trabalho que encontrou, e com essa observação desencadeou, em mim, um conjunto de reflexões que culminaram com a pergunta que lhe fiz.

Não sei ainda quais são as condições de que falava ele, mas posso adivinhar algumas. Ele é professor em Letras e deve ter-se deparado com uma panóplia
de meios e disponibilidades a que não está habituado.

Para começar, deve ter constatado que na América não se usam/esgotam pessoas doutoradas em trabalhos administrativos de rotina, num processo que classifico do mais absurdo que se pode imaginar. Depois deve ter visto trabalho de equipa e meios para o fazer, o que resulta de uma "revolução tecnológica" que nós achamos que compreendemos mas usamos mal. Essa "revolução" tem o centro na América, mas não tem nenhum Einstein, propriamente dito (passe a metáfora).

 
23 de fevereiro de 2007

 

Choque tecnológico

Ou oito ou oitenta: competitividade por salários baixos, para chinês ouvir (eles que têm salários altíssimos...), ou então discurso grandiloquente do choque tecnológico. No meio de todo este ruído politico, ainda me dá grande prazer ler opiniões racionais, objectivas, sensatas. Um exemplo foi o que disse Campos e Cunha ao Público (4.2.2007):
"Não bate a bota com a perdigota, andarmos a falar de salários baixos eao mesmo tempo de choque tecnológico".
(...) "Se calhar o mal não está naquela frase, está em ter-se andado a propagandear o choque tecnológico. A evolução tecnológica dos países é por definição lenta, logo é o contrário de um choque. Do meu ponto de vista há nesta ideia uma contradição nos seus próprios termos."
Localizando esta ideia na educação superior, centro por excelência da alimentação directa e indirecta (formação de quadros) da tecnologia, há como que um teorema. "Quando a economia tem uma solicitação a prazo de x anos, a educação superior responde a prazo de x+n anos". Qual é o valor de n?

Quando se fala em milagres de choque tecnológico, vêm logo os exemplos da Irlanda e da Finlândia. Vejamos alguns dados (Eurostat, 2006) que julgo serem relevantes.


PortugalIrlandaFinlândiaUE (27)
ID % PIB0,811,253,481,84
Empresas % despesa ID31,758,769,354,5
Formados em C&T % empregos23,444,653,541,9


Comecemos pela Irlanda. Repare-se que não se afasta flagrantemente da média da UE. Completamente diferente é o caso da Finlândia. A meu ver, há uma diferença importante. A Irlanda teve um choque tecnológico, a Finlândia um choque educativo (repare-se na terceira linha) em boa harmonia com o investimento tecnológico.

Simplesmente, o choque tecnológico irlandês é caso único. Conheço melhor um sector de grande sucesso, o da biotecnologia. O progresso dependeu essencialmente da instalação de sucursais de grandes multinacionais, mas por factores que nos são alheios: uma hora de distância em ferry de Liverpool, domínio generalizado da língua inglesa, grandes relações entre as empresas de ambos os países, uma importante e economicamente importante comunidade de origem irlandesa nos EUA. Só a seguir é que vieram as correspondentes mudanças no sistema de educação superior, que garantiram a sustentabilidade do choque.

O caso finlandês também não pode ser bem entendido sem a enorme importância de coisa muito "simples", Nokia. Mas, muito mais importante, e para concluir, o choque educativo.

 
21 de fevereiro de 2007

 

Nota técnica

já devem ter reparado que mudaram os comentários. Agora são geridos pelo Googler/Blogger. Há três possibilidades de entrada. Pode-se usar a conta Google, quando se tem. A vantagem é dar toda a informação sobre o comentador, incluindo, como no meu caso - narcisismo... - a fotografia. No outro extremo, a possibilidade de comentário anónimo, que não é muito agradável, como se compreende. Verão que também há outra possibilidade, que recomendo, "other". Não limita em nada a entrada do comentário mas permite a inserção da identificação.

Além disto, serão obrigados a uma pequena tarefa, a da repodução de uma "palavra". Peço que aceitem que isto é muito importante, para me evitar ser bombardeado com comentários piratas, de "spam".

Peço que me avisem se verificarem algum problema com esta nova configuração. Pode haver problemas mas é a forma de conseguir manter o meu sítio, que já estava congestionado com as páginas de apontamentos, bastante pesadas em dimensão. Por favor, testem os menus da barra horizontal, a ver se navegam bem entre este blogue e o sítio.

 

Novo artigo

De António Fidalgo, da Universidade da Beira Interior, "O 'horror lusitanorum' da FCT". Palpita-me que vai dar polémica. Os comentários podem ser inseridos nsta entrada.

 

Estudantes de rock

Em rescaldo de carnaval, vai hoje uma nota breve e ligeira, mas lá por isto não insignificante. Tenho nos EUA um primo meu, compositor e professor de música na Universidade de Utah. Há dias, escreveu-me e dizia "This year has been very busy at the University of Utah for both my wife and I. (…) As for myself, I had about 450 students for my History of Rock and Roll class - that was a lot of grades to figure out."

Não sei bem quantos estudantes de música temos em Portugal, ao todo e em todos os cursos. Em Utah, um estado lá nos confins, com 2,5 milhões de habitantes, há 450 estudantes - quantos serão estudantes de engenharia ou de ciências? - só num curso (isto é, para nós, disciplina) de história do rock. Dá que pensar!

 
19 de fevereiro de 2007

 

Discurso de um ministro a meio do caminho

Mariano Gago discursou há dias no Conselho Nacional de Educação. Politicamente, foi uma opção difícil, quase que exactamente a meio do mandato. Era preciso ter apresentado um bom balanço de já dois anos de governo. Com isto, era preciso que as medidas anunciadas fossem credíveis para o prazo apertado de dois anos. A meu ver, não conseguiu nem uma coisa nem outra.

O balanço foi pobre, nem podia ser outro: a alteração cosmética da lei de bases, o decreto dos CET, o do acesso de adultos, o de Bolonha. Claro que não podia faltar o exercício de estudo estrangeiro, da OCDE e da ENQA, como se fossem actividades do MCTES, durante todo este tempo. Ficamos é a saber alguns dados concretos. Sobre os CET: 60 cursos já criados! Fica longe de um simples curso por escola superior politécnica, a meu ver o sector mais vocacionado para os CET. Sobre os maiores de 23 anos: 5000 novos alunos, cerca de 6% dos novos alunos em 2006/07 e sabe-se lá quantos admitidos só para fazer número.

Sobre Bolonha, era melhor nem falar. Processo atabalhoado, com prazos curtíssimos, apreciação formalista, ausência de quadros de referência de qualificações, o delírio dos mestrados integrados, o atraso na apreciação dos novos mestrados politécnicos, muito mais.

Passa-se a seguir para o milagre de tudo o que vai ser feito na segunda metade do mandato: alargar a base de recrutamento e o número de estudantes no Ensino Superior, que deverá crescer 50 % nos próximos 10 anos (mas 10 anos é o horizonte temporal deste ministro? Valham-me todos os santos); reforçar o topo, a capacidade científica e técnica das instituições, assim como a sua capacidade de gestão, o seu envolvimento com a sociedade e a economia e a participação em redes internacionais; reforçar o sistema binário de forma inequívoca; modernizar as instituições; responder às necessidades dos jovens que terminam o ensino secundário, mas também aos adultos.

Para além da vacuidade destas boas intenções, note-se que são coisas aceitáveis de se dizer na discussão de um programa de governo, não a meio de um mandato.

Nota ainda para a informação, mais concreta, sobre o sistema de governação. Reproduz o que foi dito pelo primeiro ministro na AR e que aqui discuti, não vou repetir. A minha critica a esta proposta bizarra e incompetente ficou feita então.

Acresce agora também o anúncio da preparação de um novo estatuto de carreira. De acordo, mas sabe-me a pouco.
"Serão revistos os Estatutos das Carreiras Docentes e de Investigação, com vista a reduzir a endogamia nas instituições, a potenciar a atracção para Portugal de recursos humanos mais qualificados, estimular a mobilidade de docentes e investigadores e o seu rejuvenescimento, a colaboração com o tecido económico e a transparência e isenção dos processos adoptados para a sua selecção e promoção, sem prejuízo da desejável flexibilidade e coexistência de carreiras e modelos contratuais diversificados no interior das instituições. Nas Universidades, institui-se o doutoramento como regra geral para a entrada na carreira. Reforça-se o sistema de avaliação de desempenho de docentes e investigadores."
Fico sem perceber bem o que quer dizer outro parágrafo:
"A constituição de um conselho superior de orientação estratégica de alto nível, verdadeira autoridade para a orientação e regulação do sistema de ensino superior cujas deliberações poderão ser vinculativas, com representantes do governo, das empresas, da ciência e da cultura, da sociedade civil, de forma a articular os vários interesses subjacentes a um sistema de ensino superior articulado com as prioridades nacionais, visa contribuir para atingir o objectivo de orientação e regulação de todo o sistema."
É o Conselho coordenador do ensino superior previsto na lei orgânica do MCTES como simples órgão consultivo? Já é resultado da valorização que é feita desse conselho no relatório da OCDE? Vamos a ver.

Finalmente, para ter alguma coisa com que me congratular, fica bem, uma proposta que me merece total apoio e que já defendi num artigo de há largos tempos (15.12.2005, nem se falava na OCDE!). "A concentração do esforço de alargamento da base de acesso ao Ensino Superior far-se-á no Ensino Politécnico, especialmente através do crescimento da frequência do primeiro ciclo e de cursos vocacionais."

 
16 de fevereiro de 2007

 

Bye, Bev!

Os leitores que me são mais fieis certamente têm ideia de uma brincadeira mensal entre mim e Beverly Trayner, professora do I. Politécnico de Setúbal: a tradução mútua do apontamento do outro, nosso preferido do mês. Só suspendemos isto porque o blogue da BT mudou de tema principal. Infelizmente, há dias, voltou a publicar um "post" sobre o ensino superior. É com muita pena que reproduzo alguns excertos.
Another "moment" - of a different sort. I have just handed in my resignation to the Business School where I work. As I wrote to my coordinator:

" ... decidi seguir os meus projectos (externos) a full-time, deixando a minha (não) carreira na Escola.
Sempre tentei envolver a Escola nos meus projectos, mas sem grande successo. E agora com o processo de Bolonha e as poucas perspectivas - particularmente para uma pessoa a investigar uma área que não tem relevância para a Escola - não me sinto motivada...."

And anyone who knows any of my story here will have some idea of the weight of what I'm saying.

The Higher Education I know is in a mess. There's no room for imagination, creativity, innovation, or intellectual thought. The more mediocre and bureaucratically inclined you can be, the more you are likely to survive. Oh - and did I mention the size of your elbows and family connections?
Bev, whatever, whenever, wherever, best wishes! E obrigado pela "aula" em que fui teu aluno, em Setúbal.

 
14 de fevereiro de 2007

 

O decreto da avaliação

Tinha previsto para hoje um apontamento certamente já esperado pelos meus leitores, sobre o projecto de decreto-lei da Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior (ena, fica-se sem fôlego para dizer todo este nome! E alguém vai decorar a sigla AAAGQES?).

Parti à confiança para o escrito, parecia-me coisa fácil, mas cada parágrafo de leitura, quer do projecto quer do relatório da ENQA, me suscitava reflexões e anotações. Resultado: não cabe nestes apontamentos, ficará para artigo muito próximo, de que darei aviso.

 
12 de fevereiro de 2007

 

Publicidade enganadora


Anúncio de jornal: "Master em medicina dentária estética", oferecido por uma universidade portuguesa, em associação com uma parceira brasileira (fale-se de dentes e aparece logo um brasileiro). Fui ver ao sítio. É um curso bizarro. Demora um ano, mas compõe-se de 13 módulos, cada um com a duração de seis dias (uma semana por mês, 6,5 horas por dia de cada uma dessas semanas). Já agora, importante, 10.000 euros.

O que é este curso? Mestrado obviamente que não. A universidade pode defender-se com o direito que tem de fornecer qualquer curso fora do esquema oficial dos graus. O que não pode é induzir em erro os candidatos. Imaginem que alguém publicitava um curso chamado de "Doctor" em qualquer coisa, só com umas tantas aulas, sem investigação, sem tese. Era legal, mas não deixaria de lançar a confusão com um doutoramento.

Podem objectar-me com o caso do MBA. Creio que é diferente. É uma designação generalizada por todo o mundo e toda a gente sabe muito bem o que significa, nomeadamente que não é nenhum grau académico oficial. Por outro lado, é muitas vezes ministrado em colaboração com universidades americanas, em que Master é um grau. Não me consta que o seja em Portugal ou no Brasil, para efeitos de medicina dentária.

 
9 de fevereiro de 2007

 

Carta do SNESup

Exmo Senhor
Prof. Augusto Santos Silva
Ministro dos Assuntos Parlamentares

Exmo Senhor
Deputado Alberto Martins
Presidente do Grupo Parlamentar do
Partido Socialista

Assunto: Subsídio de desemprego para os trabalhadores da Administração Pública.

Os lugares de Ministro encarregado das relações com o Parlamento e de Presidente do Grupo Parlamentar que apoia o Governo deveriam, tais os malabarismos a que obrigam, ser unicamente ocupados por gente pouco inteligente e dotada de genuína insensibilidade social. Não é manifestamente o vosso caso, e lamentamos vê-los no papel que se têm imposto a propósito do subsídio de desemprego para os trabalhadores da Administração Pública.

Dizemos do subsídio de desemprego para os trabalhadores da Administração Pública, porque, desde a publicação do Acórdão nº 474/2002 do Tribunal Constitucional, que reconheceu a existência de uma omissão legislativa na protecção social da generalidade dos trabalhadores da Administração Pública e desde a apresentação do projecto de lei do Partido Socialista nº 236-IX, então o maior partido de oposição, que apontava no mesmo sentido, todas as nossas propostas para os órgãos de soberania têm apresentado uma versão ampla, para todos os trabalhadores da Administração Pública, e uma versão restrita, para os docentes do ensino superior e investigadores, nitidamente os mais afectados.

Deste modo

- logo após a tomada de posse do actual governo do Partido Socialista, sugerimos a vários Ministérios que o Governo aprovasse por Decreto-Lei o projecto que o PS apresentou no Parlamento enquanto oposição;

- temos apresentado periodicamente ao Dr. João Figueiredo, Secretário de Estado da Administração Pública, que se recusa a receber-nos, propostas baseadas no documento que o próprio Governo publicou em Junho de 2005 no site da Presidência do Conselho de Ministros sob o nº PL 140/2005, e que até agora não enviou à Assembleia;

- apresentámos por duas vezes, a propósito da aprovação das Leis do OE para 2006 e 2007 (a última subscrita também pela FENPROF) a instâncias parlamentares propostas de inclusão de um artigo instituindo o subsídio de desemprego para a toda a Administração Pública, que um Grupo Parlamentar (o do BE) aceitou introduzir para votação na Comissão do Orçamento e Finanças, tendo sido recusadas, em ambos os casos, pelo Partido Socialista.

Deste modo, ao justificarem a rejeição do Projecto de Lei nº 159/X (PCP) com a vossa preferência por "soluções gerais" em vez de "soluções parciais", estão não só a tentar iludir os mal informados e a adiar qualquer solução, mas também a saltar da frigideira para o lume: é que as "soluções gerais" que vos temos apresentado também têm sido rejeitadas, mas se insistem tanto em "soluções gerais", ignorando que neste momento o problema afecta sobretudo os docentes do ensino superior, voltaremos a confrontar-vos com elas.

Com os melhores cumprimentos

Paulo Peixoto
Presidente da Direcção do SNESup

 
7 de fevereiro de 2007

 

O calendário do MCTES

A discussão sobre o "eduquês" provoca-me logo uma atitude de defesa. É muitas vezes demasiadamente apaixonada e não circunscrita ao que deve ser. Por exemplo, todas as consequências práticas do construtivismo são dependentes do nível etário. Não posso discutir a aquisição de competências na educação superior, segundo o paradigma de Bolonha, com que concordo inteiramente, extravasando a situação de adultos jovens para a situação das crianças, de cuja pedagogia não sei nada. Já escrevi sobre isto, com maior aprofundamento.

Há pouco tempo, manifestei o meu espanto em relação à proposta de professores do 2º ciclo do básico poderem ser polivalentes. No Público de 31.1.2007, Guilherme Valente aborda o mesmo problema, com a minha concordância. Mas aproveito o seu artigo para uma citação importante.

"Mas julgo vislumbrar a mudança no horizonte. Este actual estádio supremo do eduquês deverá ser também o seu estertor. E julgo ter boas razões para pensar que a mudança vai acontecer com José Sócrates. Não é possível adiar mais e ele percebe onde está a essência do problema e acredito, e apoio, a sua atitude reformadora. Enganou-se com a ministra, mas estará a verificar o engano e irá corrigi-lo. Os próximos resultados vão ser piores e o chefe do Governo sabe que não haverá desenvolvimento nem diminuição das desigualdades sem outra escola, sem um ensino que desafie alunos e professores, que qualifique e forme, que realize as diferentes potencialidades de todos."

Pelos vistos, Guilherme Valente tem mais acesso aos segredos dos deuses do governo do que eu. José Sócrates vai impor-se? Sou mais descrente. Parece-me que o tempo de intervenção de Sócrates sobre os ministros se está a esgotar e que ele, com a maestria política que se lhe deve reconhecer, vai passar a jogar só pela positiva, por quem lhe dê vazas. O tempo é curto, como explicarei adiante.

Mas o que é que isto tem a ver com a educação superior? Porque tudo isto se aplica, talvez ainda mais, ao MCTES. José Sócrates vai impor-se? Duvido, porque o calendário não ajuda. De facto, o MCTES só dispõe de 4 meses. Parece-me que, a partir de Julho e até às eleições, a regra vai ser "não façam ondas", mas também a de não fazer nada para desacreditar ministros, por ineptos que sejam. A partir de Julho é a presidência portuguesa da UE e será sem dúvida o tempo absoluto de Sócrates, como afirmação pessoal a nível internacional, talvez pensando no futuro. Depois, 2008 é só para preparar as eleições, sem crises nem grandes discussões políticas. Tenho o palpite de que o MCTES no fim de 2008, em vésperas de eleições, será exactamente o MCTES deste Fevereiro de 2007, igual ao de Fevereiro de 2006.

Por isto, só antecipo duas leis, a agora apresentada da avaliação, relativamente pacífica e a da autonomia, longe de ser pacífica mas em que o governo não pode recuar, porque já há muito deu entrada um projecto de lei do PSD. Curiosamente, não se tem ouvido falar dele. Que negociações terá havido para o PSD o manter em lume brando, apesar de ser sempre, para o governo, uma espada de Damocles?

 
5 de fevereiro de 2007

 

A Universidade Aberta

Novos públicos, educação recorrente, aprendizagem ao longo da vida, formações à medida, tudo coisas hoje de indiscutível importância. Tecnicamente, tudo isto se relaciona muito com a educação à distância e o "e-learning". Creio que tenho direito de me gabar de, há já uns tantos anos, ter dedicado todo um capítulo do meu livro "A universidade no seu labirinto" à universidade virtual.

No entanto, dou por mim a esquecer-me frequentemente de referir a nossa universidade dedicada principalmente a esta área da educação superior, a Universidade Aberta. Um leitor assíduo, Domingos Caeiro, tem-me chamado a atenção e desafiei-o a colaborar comigo, neste espaço. Enviou-me um texto que, tecnicamente, não cabe nesta página de leitura rápida de textos curtos. Passei-o a artigo.

Leiam: "A educação superior e a Universidade Pública de ensino a distância".

 
2 de fevereiro de 2007

 

O relatório da OCDE (XII)

O financiamento

Concluindo a série de apontamentos sobre o relatório da OCDE, alguma coisa sobre o financiamento. Julguei que era tema para muita discussão mas, para minha surpresa, ficou muito moderado em relação ao que eu adivinhava, as receitas da OCDE: aumento considerável das propinas, reforço considerável dos financiamentos privados (nunca dizem como).

Afinal, até propõem que as propinas se mantenham ao nível actual, embora sujeitas a actualização em função da taxa de inflação. No entanto, uma no prego outra na ferradura. Subjacente, fica a consideração pela OCDE que temos um nível baixo de participação das famílias, em termos do valor das propinas relativo ao financiamento total: 17%, contra a média de 19% da OCDE, mas distante do que entendem como desejável, a tender para cerca de 40%! Não lhes chamaram a atenção para a nossa Constituição?

Também não se pode esquecer que, segundo dados do relatório, a evolução do financiamento entre 2001 e 2004 foi disparatada: o financiamento público aumentou 0,76 vezes, o das propinas 21,6 vezes. Repare-se nas datas. São posteriores à actualização das propinas, pelo ministro Marçal Grilo.

Tal como se adivinha ser a atitude definitiva do governo, o relatório limita o financiamento público ao primeiro ciclo de Bolonha. Já escrevi muito sobre isto, discordando, está na página de artigos, não vou repetir-me. No entanto, o relatório vai mais longe, sibilinamente, incluindo no financiamento essencialmente privado a educação profissional. Isto significa que os anos além Bolonha dos chamados mestrados integrados ou de cursos como o de medicina teriam propinas consideravelmente mais altas?

Boa parte do capítulo (e um anexo) aborda o sistema de empréstimos. Não cabe esta discussão neste espaço, mas já o fiz num artigo encomendado pela APESP e que colocarei em breve na minha página de artigos (avisarei). A experiência internacional, ainda muito restrita, mostra que é matéria muito difícil e com resultados ainda controversos. Não me parece que possa ter a força de "grande receita" que a OCDE lhe pretende atribuir. Voltarei ao assunto, que me tem interessado muito e sobre o qual julgo ter boa documentação.

Como aspecto positivo, mas muito problemático em termos de concretização, este capítulo do relatório volta a basear-se muito numa lógica de contratualização e de avaliação de desempenho, de cumprimento de objectivos em termos de "fitness for purpose". Muito bem, mas quero ver como vai funcionar, num fundo sedimentado de igualitarismo, recusa da competição e nivelação por baixo que ainda caracteriza muito o nosso sistema de educação superior.

Anote-se, finalmente, que o relatório não embarca no estafado argumento da nossa boa posição no financiamento da educação superior, em termos de percentagem do PIB. O que apontam, como tantas vezes tenho escrito, é que o importante é o valor absoluto da despesa média por estudante, no fundo da lista dos países da OCDE.

Subscrever Mensagens [Atom]