2 de fevereiro de 2007

 

O relatório da OCDE (XII)

O financiamento

Concluindo a série de apontamentos sobre o relatório da OCDE, alguma coisa sobre o financiamento. Julguei que era tema para muita discussão mas, para minha surpresa, ficou muito moderado em relação ao que eu adivinhava, as receitas da OCDE: aumento considerável das propinas, reforço considerável dos financiamentos privados (nunca dizem como).

Afinal, até propõem que as propinas se mantenham ao nível actual, embora sujeitas a actualização em função da taxa de inflação. No entanto, uma no prego outra na ferradura. Subjacente, fica a consideração pela OCDE que temos um nível baixo de participação das famílias, em termos do valor das propinas relativo ao financiamento total: 17%, contra a média de 19% da OCDE, mas distante do que entendem como desejável, a tender para cerca de 40%! Não lhes chamaram a atenção para a nossa Constituição?

Também não se pode esquecer que, segundo dados do relatório, a evolução do financiamento entre 2001 e 2004 foi disparatada: o financiamento público aumentou 0,76 vezes, o das propinas 21,6 vezes. Repare-se nas datas. São posteriores à actualização das propinas, pelo ministro Marçal Grilo.

Tal como se adivinha ser a atitude definitiva do governo, o relatório limita o financiamento público ao primeiro ciclo de Bolonha. Já escrevi muito sobre isto, discordando, está na página de artigos, não vou repetir-me. No entanto, o relatório vai mais longe, sibilinamente, incluindo no financiamento essencialmente privado a educação profissional. Isto significa que os anos além Bolonha dos chamados mestrados integrados ou de cursos como o de medicina teriam propinas consideravelmente mais altas?

Boa parte do capítulo (e um anexo) aborda o sistema de empréstimos. Não cabe esta discussão neste espaço, mas já o fiz num artigo encomendado pela APESP e que colocarei em breve na minha página de artigos (avisarei). A experiência internacional, ainda muito restrita, mostra que é matéria muito difícil e com resultados ainda controversos. Não me parece que possa ter a força de "grande receita" que a OCDE lhe pretende atribuir. Voltarei ao assunto, que me tem interessado muito e sobre o qual julgo ter boa documentação.

Como aspecto positivo, mas muito problemático em termos de concretização, este capítulo do relatório volta a basear-se muito numa lógica de contratualização e de avaliação de desempenho, de cumprimento de objectivos em termos de "fitness for purpose". Muito bem, mas quero ver como vai funcionar, num fundo sedimentado de igualitarismo, recusa da competição e nivelação por baixo que ainda caracteriza muito o nosso sistema de educação superior.

Anote-se, finalmente, que o relatório não embarca no estafado argumento da nossa boa posição no financiamento da educação superior, em termos de percentagem do PIB. O que apontam, como tantas vezes tenho escrito, é que o importante é o valor absoluto da despesa média por estudante, no fundo da lista dos países da OCDE.

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