30 de março de 2007

 

A carta de princípios do CRUP (I)

Por vias um pouco travessas, chegou-me às mãos um documento recente do CRUP, que nem sequer está publicado no seu sítio. Até se diria que o CRUP não dá grande importância ao seu documento "Novo Enquadramento Legal do Ensino Superior - Carta de Princípios", de 13 de Março último.

Eu, que sou geralmente muito critico do CRUP, até considero que é, em geral, um documento muito razoável. Isto com alguma generosidade e apenas em termos relativos, por comparação com o que eram há uns tempos as opiniões emanadas do CRUP.

Hoje, começo pela autonomia. Anote-se logo que o CRUP considera a avaliação como um pilar fundamental do quadro da autonomia. Muito bem, já é tempo de deixar de se ver a autonomia como direito sagrado das universidades, sem prestarem contas do exercício desse direito especial que a sociedade lhes atribui.

Logo a seguir, uma frase pelo menos muito discutível: "A Legislação deve indicar a missão da Universidade". Missão, no singular? A autonomia pouco se justifica se não for para potencializar a diversidade das missões de cada universidade, com competição interna do sistema. Sempre tive curiosidade de ler o que seriam as habituais declarações de missão ("mission statements") das nossas universidades se a lei as obrigasse a inscrevê-las nos estatutos, sem cópia dos objectivos que vêm, como fórmula única, na lei da autonomia.

A carta prossegue com a listagem dos conteúdos da autonomia e desilude. É coisa balofa, jurídica, sem significado substancial. Surpreendente é o que se refere à autonomia financeira:
"a) Elaborar e aprovar os seus orçamentos e os seus planos plurianuais, gerir livremente as verbas que lhes são atribuídas pelo Orçamento do Estado, possuir a capacidade de transferir verbas entre as diferentes rubricas e capítulos orçamentais;
b) Possuir a capacidade de obter receitas próprias e de as gerir de acordo com critérios por si estabelecidos, incluindo os respectivos saldos de gerência;
c) Poder participar em Associações, Sociedades e outras entidades de natureza privada, com vista à prossecução dos seus fins estatutários;
d) Arrendar edifícios indispensáveis ao seu funcionamento;
e)Adoptar uma gestão financeira flexível que permita ter acesso aos mecanismos oferecidos pelo mercado financeiro."
Os reitores são mesmo gestores? É isto tudo o que a sua experiência lhes suscita como exigências? Compare-se com o que sobre isto escrevemos, José Ferreira Gomes, Sérgio Machados dos Santos e eu:
6.1. As normas de gestão são, com as necessárias adaptações, as das entidades públicas empresariais.
6.2. O financiamento público é determinado com base numa previsão plurianual e em sistema de "financiamento envelope" contratado, sem prejuízo de utilização de métodos de cálculo indicativo, por fórmula.

 6.2.1. As IES têm liberdade de transferências entre rubricas orçamentais;
6.2.2. Não pode haver cativações incidindo sobre as receitas próprias;
6.2.3. As IES podem fazer requisição de fundos integral, logo no início do ano, para as rubricas de equipamento;
6.2.4. É obrigatória a compensação, até ao mês de Junho, dos encargos decorrentes de aumentos salariais da função pública.
6.3. A contabilidade é exclusivamente a do POCE, sem obediência às regras da contabilidade pública.
6.4. A gestão de pessoal é autónoma, segundo regulamentos próprios, com excepção das categorias de professor catedrático e de professor associado, reguladas pelo estatuto da carreira docente universitária.
6.5. As IES estão isentas da sujeição a vistos prévios do Tribunal de Contas, mesmo para contratos de pessoal.
6.6. As IES gerem autonomamente o seu património imobiliário.
6.7. Em contrapartida de responsabilidade, estão obrigadas a contabilidade segundo o plano oficial de contas, incluindo a obrigação de contabilidade analítica; prestação de contas à tutela e ao Tribunal de Contas e sua divulgação pública; apresentação de um plano orçamental previsional; obrigação de parecer de um conselho fiscal, incluindo um técnico revisor de contas do sector privado e um quadro qualificado da contabilidade pública.
6.8. O regime de autonomia financeira será regulamentado por decreto-lei, designadamente no que diz respeito ao ponto 6.1.
Talvez muitos leitores não se apercebam da diferença, mas certamente que não os que sabem mesmo de gestão.

Comentários:
Este documento é mesmo um primor!
Cheio de contradições relativamente à contratação de docentes:
Após leitura de alguns ítens (critérios e afins!) que poderão beneficiar a endogamia ... eis a "salvação da pátria"!
g) Devem ser introduzidas regras que dificultem a endogamia;
 

 

 

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