28 de março de 2007

 

O decreto da avaliação (XII)

O financiamento da agência

Termino esta série de apontamentos com um aspecto que não é de somenos, o do financiamento da agência. Afinal, é muito nisto que se decide uma coisa essencial, a sua independência. Segundo o decreto, a agência vai ser constituída, como fundação, com uma dotação inicial ("endowment") de um milhão de euros. Saliente-se que ela não terá poderes para fazer investimentos financeiros do seu capital, se por acaso isto fosse capital que se visse. Com esta fortuna inicial, a agência vai poder fazer obras de adaptação e instalação, comprar mobiliário, computadores, central telefónica, automóvel, tudo coisa para 500.000 euros. Lá se vai metade do "capital".

É certo que, até ao fim de 2008, terá ainda uma dotação especial única de 3 milhões de euros, para instalação. E para arranque de funcionamento? Tenha-se em conta que o actual sistema de avaliação custa cerca de 6 milhões de euros por ano, segundo as contas que consigo estimar, mas agora despesa agravada por muito maior âmbito da acreditação. Assim, o que é significativo no projecto é que as receitas da agência são essencialmente as devidas pela avaliação e acreditação, a suportar exclusivamente pelas instituições. Note-se que isto vai contra a proposta da ENQA, que sugeria uma comparticipação das instituições entre 25 e 50% das despesas.

Pode-se contrapor que isto só seria lesivo para as instituições privadas, na medida em que o Estado, na dotação orçamental das púbicas, inscrevesse uma dotação especial e consignada para a avaliação. Alguém é assim tão ingénuo?

Um risco previsível é o de a agência ajustar por baixo as suas tarifas às capacidades financeiras das instituições. Obviamente que isto significaria ajustar por baixo o rigor da avaliação. O próprio governo pode pressionar nesse sentido, face aos protestos das instituições. Outro risco é o de a agência também ter de embaratecer o preço da validação da acreditação feita por outras agências. Isto não me parece hipótese muito remota. Se fosse gestor, a ter de pagar, avaliaria bem se não era maior valia recorrer a uma agência internacional de prestígio, mesmo pagando um pouco mais. Nesta situação, a pressão de mercado também contribuiria para uma espécie de "dumping" da agência e para que a certificação da acreditação alheia fosse apenas um carimbo. num país com cultura enraizada de facilitismo, nada disto me parece uma especulação fantasiosa.

Afinal, há aqui também uma questão de filosofia política. A garantia de qualidade da educação superior é matéria de interesse público, é responsabilidade do Estado e, como tal, deve ser assegurada financeiramente. Mas a necessidade de independência da agência? Não é obrigatoriamente, ou até pelo contrário, questão de financiamento. Pensemos num exemplo absurdo. Os tribunais têm de ser independentes. Logo, não devem ser financiados pelo Estado, só pelas custas judiciais.

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